Quando a gente se (re)conhecer...
O meu encontro com alunos e professores nas escolas é certamente o ponto mais alto do Projeto Douradinho. Em 2017 serão cerca de 130 momentos como este, em cidades de RJ, SP, ES, MG, DF, GO e PA. Escrevo este texto para explicar com detalhes como planejei este evento, e como ele pode ser melhor aproveitado por todos.
A equipe do projeto também chama o momento de encontro com o autor de “contação”. No entanto, diferente de uma contação de histórias ordinária, onde um ator narra uma história escrita por um terceiro, sou eu mesmo, o autor do livro Amiga Lata, Amigo Rio a contar a história que criei, vivi e ainda vivo. Não só a história descrita no livro, mas entrelaçada a ela toda minha história pessoal como autor desta obra; e também o histórico do projeto, algum conteúdo a respeito da preservação ambiental, objetivos e sonhos para o futuro.
Sendo cada encontro único, dada a diversidade de público, de estruturas dos locais de apresentação e até mesmo de interesse, sempre faço alterações de última hora no meu roteiro, que em linhas gerais cumpre as etapas abaixo:
Apresentação: Quando me apresento e explico porque escrevi o livro “Amiga Lata, Amigo Rio”.
Contação: Quando narro o início do livro, com ajuda de um boneco. Em linhas gerais, também visito os capítulos mais marcantes e falo de alguns personagens e conceitos, destacando o que acho mais conveniente para cada audiência.
Engajamento: É quando falo do projeto, seu histórico e planos, e explico suas duas Etapas. É uma oportunidade de encorajar professores e alunos a realizarem as atividades descritas em nosso projeto pedagógico.
Interação: Quando os alunos e professores me fazem perguntas e tiram dúvidas a respeito do livro, do projeto ou de minha carreira como autor.
Caso necessário, antes da abertura posso fazer uma canção para colocar todos dentro na mesma energia. Normalmente também costumo abrir a etapa de engajamento com uma música para emoldurar o que vai ser dito, com o suporte da viola do Ricardo Abrahão – mas é bom reforçar que posso decidir, por motivos vários, não cantar esta música, da mesma forma como posso encurtar ou me aprofundar em qualquer uma das etapas deste roteirinho.
Assim sendo, vejo cada encontro como um momento único, onde sempre coloco minhas melhores intenções para que todos ali presentes, se ainda não leram o livro Amiga Lata, Amigo Rio, que tenham vontade de ler. Se leram, que relembrem da história e reflitam mais a respeito dela (SENTIR). Se não debateram a temática e o conteúdo do livro em sala de aula, que saiam dali enxergando os rios de forma ligeiramente diferente (PENSAR). Se já estão empoderados de conceitos e conteúdos, que se motivem a colocar em prática as atividades propostas pelo projeto (QUERER).
E, mais do que tudo isso, que ao menos este momento tão raro de encontro de um autor com seus leitores no espaço da escola forme público leitor e, quem sabe, até mesmo sirva de inspiração para que novos escritores surjam no futuro. Afinal, somos pessoas de carne e osso, ideias e defeitos, como nossos leitores. Qualquer pessoa pode se tornar escritor um dia.
Para que a contação tenha o melhor aproveitamento possível, seguem algumas premissas que fazem toda a diferença:
Sobre o público: o público principal do Projeto Douradinho gira em torno dos 08 a 10 anos de idade, mais ou menos entre o 3º e o 5º ano. Embora alunos mais velhos ou mais novos também possam participar do projeto, a apresentação certamente sofrerá mais adaptações quando os menores ou os mais velhos estiverem presentes. E muito mais se públicos de idades tão díspares estiverem juntos! Não me nego quando uma escola inteira decide parar tudo para me receber e escutar, mas sempre prefiro quando existe a possibilidade disto não acontecer.
Sobre o local: Eu, que já viajei por todo o Brasil visitando escolas sei muito bem que são raros os auditórios de acústica perfeita. Normalmente os encontros acontecem em salas de aula, salas de leitura, pátios e quadras de esportes. Mas é sempre bom reforçar que quanto mais confortável é o espaço para todos, mais chance teremos de viver momentos inesquecíveis.
Sobre equipamento: Quando estou na estrada costumo fazer 3, 4 ou até 5 apresentações por dia, semanas a fio. É uma maratona prazerosa, mas também muito cansativa e que força demais a minha voz. Prefiro falar a capela, mas sempre peço microfone e amplificador caso sinta a necessidade. Difícil passar pela escola que não possui este tipo de equipamento. O que é muito comum, infelizmente, é do equipamento não ser adequado para o espaço escolhido, ter o fio de microfone muito curto, chiar etc. Por isso peço à administração das escolas que testem e planejem tudo com antecedência.
Sobre preparação: Quando os ouvintes já conhecem o livro, ou foram preparados para o nosso encontro de alguma forma pelas educadoras, tudo tende a fluir mais. O interesse e engajamento dos alunos fazem surgir perguntas interessantes, e me possibilitam ir mais profundo ao falar tanto do livro quanto do projeto. Ao contrário, um público pouco engajado, que não sabe para quê está ali, é muito difícil de conduzir. Com isso a contação pode se tornar mais superficial e cansativa para todos nós. Para que isso não aconteça, prefiro que os alunos tenham lido o livro e debatido sua temática em sala de aula, ou que ao menos saibam quem está ali para conversar com eles, e porquê. Também é ótimo quando as perguntas são feitas e selecionadas com antecedência.
Para finalizar, como diria Saint-Exupery, “Cada um que passa em nossa vida, leva um pouco de nós mesmos, e deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito, e há os que deixam muito, mas não há os que não deixam nada...” ou, como disse nosso cartunista maior, Henfil, “Se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver flores, valeu a sombra das folhas; se não houver folhas, valeu a intenção da semente. “
Ou, como diria eu mesmo, “Nunca sabemos o que o futuro trará. Mas ele virá.” Que chegue com alegria o dia que a gente se encontrar!